O LIVING ROOM
Os anos setenta, como já contei na postagem inicial, foram para mim os tais “anos dourados”, e não os cinquenta, como cantava Chico Buarque nas rádios da época. O tempo útil que sobrava da semana era a sexta-feira no avião, uma vez que nosso belo escritório ficava em Botafogo, mas a obra se estendia pelos quinhentos quilômetros do porto de Tubarão até as áreas mineiras das Minas Gerais.
E era nesse tempo que eu lia a parte mais leve dos jornais, a ilustrada, a do lazer e dos eventos culturais. Foi numa dessas que vi um edital do leilão de um bar e uma biblioteca do Joquei Clube do Rio de Janeiro. Nunca me interessei por cavalos e muito menos pelas suas conquistas. Não sei o que me chamou mais a atenção, se o termo “biblioteca” ou, mais provavelmente, o termo “bar”.
Quanto ao primeiro, logo vi que não se tratava de raças ou rações para equinos, nem de selas ou bridões, muito menos de prêmios conquistados ou novidades veterinárias. Quanto ao segundo, preferi ler o edital completo antes de me entusiasmar muito... O que se estava a leiloar eram estantes para livros, sobre um mezanino com escada caracol, pisos de tábuas largas e corrimãos trabalhados. O capítulo bar não citava líquidos fermentados, muito menos destilados, mas sim um balcão enorme, com prateleiras de madeiras entalhadas.
O impulso de fechar aquela página sumiu ao me lembrar de minha arquiteta, que também tinha funções de esposa (claro, além de tantas outras que mulheres adoram enumerar, e com toda a razão...) Fato é que ela estava no momento procurando soluções para acomodar um bar junto ao living da casa que estávamos a construir no Jardim Itanhangá, Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. E não é que as tralhas que o Joquei estava leiloando, certamente para se livrar delas antes de inaugurar sua nova sede de campo, poderiam até ser úteis?
Mas o leilão era dia... hoje? É o que dizia o edital, que prossegui lendo. As peças poderiam ser vistas no mesmo dia, quer dizer... hoje? Parece que sim, e até as 14 horas! Olhei para o relógio e depois para a janela do avião, dia lindo, sobre a água, já se via a baia de Guanabara? Eu me distraí com aquele leilão, já devíamos estar nos preparando para pousar no Santos Dumont.
Mas onde o tal leilão aconteceria? Voz feminina interrompendo: “...senhores passageiros... encosto na vertical... apertem seus cintos...” Antes de fechar o matutino anda vi o endereço: Av. Rio Branco, número... já sei onde é! Fechei.
Era quase uma da tarde. Será que dá tempo? Pensei Rio, lembrei Caetano, Vinicius, o Cristo do Corcovado, é sexta-feira e estamos no Rio de Janeiro. É óbvio que vai que dar tempo!
Para encurtar esta conversa, depois de ter visto, ainda que superficialmente e desmontados, num galpão, não só o bar e a biblioteca, mas arandelas e grades de sacada tudo isso inspirado no neoclássico inglês, não tive como não arrematar um caminhão de ferros e madeiras que na sexta-feira seguinte chegou ao Itanhangá com sua preciosa carga. Mas não o bar, oh decepção. A peça tinha uns oito metros de extensão não caberia nem sonhando em nossa sala. Mesmo assim o resultado não correspondeu às expectativas. Simplesmente superou-as, e muito!
Para encurtar esta conversa, depois de ter visto, ainda que superficialmente e desmontados, num galpão, não só o bar e a biblioteca, mas arandelas e grades de sacada tudo isso inspirado no neoclássico inglês, não tive como não arrematar um caminhão de ferros e madeiras que na sexta-feira seguinte chegou ao Itanhangá com sua preciosa carga. Mas não o bar, oh decepção. A peça tinha uns oito metros de extensão não caberia nem sonhando em nossa sala. Mesmo assim o resultado não correspondeu às expectativas. Simplesmente superou-as, e muito!
E tem mais, as arandelas eram maravilhosas peças de bronze, as grades de sacada que pareciam ser de ferro, depois de limpas revelaram também seu bronze e, claro, dispensaram qualquer retoque. A biblioteca era uma peça magnífica de madeira trabalhada com cristais bisotados.
A escada em caracol tornou-se a “prima donna” daquele, agora sim, merecidamente chamado, “Living Room”.